*Gilvan Azevedo
“A libertação da classe operária tem que ser feito dos próprios trabalhadores.” (Karl Marx)
Temos acompanhado, há algumas semanas, um debate nas redes
sociais sobre os descontos que vêm acontecendo irregularmente nos vencimentos
dos(as) professores(as) da rede estadual de educação maranhense. Este fato tem
causado a justa indignação do conjunto dos educadores, revolta esta que se
justifica pela natureza de como são feitos os “saques” nos proventos dos(as)
trabalhadores(as) em educação do Estado. Primeiro por ser um desconto
compulsório e sem nenhuma deliberação da base de qual o destinação dos recursos, segundo por terem recolhido duplos e até triplos valores sobre o mesmo
período e por fim, o mais revoltante: por ser destinados a uma organização que
não tem nenhuma inserção na base dos docentes, o até antes desconhecido
SINTSEP, já que os educadores maranhenses “contam” com uma organização
igualmente inoperante que já faz recolhimento do famigerado imposto sindical
sem destiná-lo à luta dos trabalhadores em educação, o Sinproesemma (CTB/PCdoB).
Nos debates nas redes sociais, identificamos as mais
variadas formas de expressão de indignação dos docentes e o apelo a quase todo
tipo de reação, como a negação do sindicato, o convite à impetração de ações
judiciais para devolução dos valores recolhidos e até defesas de desfiliação massiva
dos associados do Sinproesemma. Sobre essas considerações pretendemos
contribuir com o debate para que possamos avançar na organização da luta da
classe trabalhadora e na retomada de nossos instrumentos de luta que são os
sindicatos, pois entendemos que o desconto via imposto sindical, não se trata
apenas de um problema de forma, mas, fundamentalmente, um problema de conteúdo.
A função dos Sindicatos
Marx e Engels afirmam em O Manifesto do Partido Comunista
que: “a história de todas as sociedades que existiram até hoje é a história de
luta de classes”, que na sociedade capitalista se expressa pela subordinação do
trabalho ao capital e pelo antagonismo irreconciliável da burguesia com
proletariado. Com o advento da Revolução Industrial na Inglaterra do século
XVIII, o consequente aparecimento do trabalho assalariado sob o intenso regime
de exploração da pueril classe operária pela burguesia inglesa, foi ao longo do
século XIX construindo as bases para a construção da consciência de classe
entre os trabalhadores. Os sindicatos surgem como organismos legítimos da
classe trabalhadora frente aos ferozes ataques da burguesia contra os
interesses do proletariado. Henrique Canary, discorrendo sobre os sindicatos
escreve:
Os sindicatos são o resultado inevitável da divisão da sociedade em explorados e exploradores. Existem lutas e organização sindicais praticamente desde que existe o capitalismo. Por isso também é possível afirmar que, enquanto houver burgueses e proletários, vai haver luta e organização sindical: poderá ser diferente, clandestina, reprimida etc., mas vai haver. Toda a história aponta neste sentido
No Brasil, decorrente do modelo agroescravocrata que
perdurou durante grande parte de nossa história, a classe operária brasileira começa
a se desenvolver tardiamente no final do século XIX.
Primeiro de orientação anarquista e posteriormente comunista
os sindicatos, em sua gênese, constituíram-se em pontos de apoio à luta da
classe operária brasileira e conseguiram através da luta consequente contra os
patrões arrancar importantes vitórias contra a exploração capitalista, podemos
citar algumas como, proibição do trabalho infantil, regulamentação da jornada
de trabalho, descanso remunerado e aumento de salários.
Essas vitórias só foram possíveis porque esses sindicatos
eram independentes dos governos e dos patrões, seus objetivos eram de lutar
contra, a exploração capitalista sobre a classe trabalhadora, as péssimas
condições de trabalho e os baixíssimos salários; reinava a democracia operária e
os trabalhadores eram livres para decidir suas formas de organização.
Do Sindicalismo de Estado Varguista ao Lulopetismo cutista
Em 1930, quando Vargas assumiu a presidência esses
sindicatos independentes são perseguidos e o governo começa a controlá-los através
do que ficou conhecido como sindicalismo de Estado. Vito Giannotti escrevendo
sobre esse processo, afirma:
A partir de Vargas, esses sindicatos são obrigados a desaparecer, em seu lugar, nasce um outro sindicalismo. Um sindicalismo que esquece a luta de classes e, mais ainda, o conceito de classes sociais. Não haveria mais o patrão, de um lado, e operário, do outro. Agora seria o “empregado” e o “empregador”. Duas palavras quase idênticas. Só um pequeno “r” de diferença.
É nesse contexto que o governo Vargas, não sem resistência,
estatiza os sindicatos que para poder funcionar precisam de um estatuto e de
uma carta sindical oferecida pelo governo além de instituir o famigerado
imposto sindical, valor compulsório que é descontado anualmente de todo(a)
trabalhador(a) e que corresponde a um dia de trabalho, sendo esse(a)
trabalhador(a) sindicalizado(a) ou não, a maioria das direções burocratas e
governistas fazem defesa da manutenção do imposto, alegando que sem ele o
sindicato deixaria de existir, escamoteando dessa forma o verdadeiro sentido da
existência de tal desconto, que é o de atrelar os sindicatos ao Estado. Sobre
isso, Zé Maria explica:
(...) O sindicato para ser independente, deve depender apenas de financiamento oriundo dos trabalhadores, decidido democraticamente em suas instâncias. Isso pressupõe acabar com o imposto sindical ou qualquer outra fonte compulsória de arrecadação de recursos para os sindicatos. Tratam-se, na verdade, não de fontes de financiamento da luta dos trabalhadores, mas sim fontes de reprodução da burocracia sindical. (grifo nosso)
Com a ascensão de Lula à Presidência da República, a relação
entre a burocracia sindical brasileira e o aparelho de estado ganhou novos tons
e os sindicatos filiados à CUT e à outras centrais pelegas e governistas
perderam sua independência de classe, deixando de defender os interesses de
seus associados e passaram de malas e cuias para o lado do governo. A manutenção
do imposto sindical foi um dos atrativos utilizado pelo governo do PT para
trazer para dentro do governo parte das direções das centrais e seus
sindicatos.
Em matéria divulgada no site da CSP Conlutas em 2012,
pode-se ler que:
Cinco centrais sindicais embolsaram R$ 138 milhões referente ao chamado Imposto Sindical, entre janeiro e outubro deste ano. Até dezembro, a soma total pode chegar a R$ 160 milhões, dinheiro que sai do bolso do trabalhador e será repassado pelo governo federal à CUT, Força Sindical, CTB, UGT e NCST.
E o bolo fica assim dividido:
Do total arrecadado, 60% são repassados aos sindicatos, 15% às federações, 5% às confederações e 20% ficam com o Ministério do Trabalho, para financiar programas como o Fundo de Amparo ao Trabalhador (FAT), que custeia o seguro-desemprego e o PIS. Em 2008, o então presidente Lula determinou que, do total repassado ao FAT, 10% deveriam ser destinados às centrais sindicais. De lá para cá, as centrais já receberam cerca de R$ 530 milhões, valor que não precisa ter nenhuma prestação de contas. CUT e Força Sindical ficam com as maiores parcelas do imposto, R$ 44,5 milhões e R$ 40 milhões, respectivamente. Apesar de se declarar formalmente contra a cobrança, a CUT não devolve o dinheiro aos trabalhadores.
Com esse volume de dinheiro, que o governo desconta
compulsoriamente do trabalhador e credita nas contas das Centrais não é difícil
concluir de que lado as direções governistas vão ficar e quais interesses irão
defender.
Retornando ao debate que abre esse artigo sobre a indignação
dos educadores maranhense e suas formas de reação, achamos que devemos avançar
nos debates acerca dos descontos, pertencemos a categoria e estamos igualmente
indignados, mas acreditamos que só indignação não resolverá o problema, muito menos as propostas apresentadas nos
grupos virtuais, vamos a elas:
1- Desfiliação em massa resolveria o problema do imposto
sindical?
Afirmamos categoricamente que NÃO. Esta é a principal contradição
introduzida pelo desconto compulsório, o(a) trabalhador(a) não precisa ser
sindicalizado para ter seu dinheiro “sequestrado”. Ou algum servidor precisou
ser associado ao SINTSEP para ter o desconto em seus vencimentos, no nome dessa
instituição?
2- A busca do Auxilio da justiça através de ações judiciais
garantiriam a devolução do dinheiro descontado?
Quem acreditar na justiça burguesa pode fazê-lo, só não deve
esquecer-se que, é essa mesma justiça que decreta a greve dos trabalhadores
ilegal, que arbitra multas altíssimas aos sindicatos combativos e o mais
importante: a justiça é parte do estado burguês e sempre vai defender os
interesses da classe que está no poder. Não esqueçamos que foi o próprio TRT
Maranhão quem legitimou a anulação da eleição do Sindeducação, em 2012, na qual
foi eleita democraticamente a Chapa 1 “Unidade para Mudar” e manteve o golpe
perpetrado pela atual gestão, indo contra a decisão de milhares de educadores
naquele momento. O resumo da ópera todos nós já sabemos: o atrelamento do
Sindicato à Prefeitura Municipal de São Luis (PMSL) e o aprofundamento do caos
na educação publica municipal.
3- A negação do sindicato. Os sindicatos não seriam mais necessários?
Do exposto, acreditamos ser impossível a negação dos
sindicatos, por tudo que essas organizações representaram e representam para a
luta da classe trabalhadora contra os ataques ferozes dos patrões e dos
governos. Não podemos confundir os sindicatos, que são a expressão maior da
organização dos trabalhadores com as burocracias que vem se locupletando há
décadas em nossos sindicatos e que tem servido como diques na organização e no
avançar das lutas do proletariado. Neste sentido, não é o sindicato que deve
ser negado, mas as direções traidoras é que devem ser extirpadas dos organismos
legítimos da classe trabalhadora.
O que fazer?
Um primeiro passo seria a mobilização permanente contra a cobrança do imposto sindical. A CSP Conlutas é a única Central que não recebe o imposto sindical e orienta todos os seus sindicatos a fazerem o mesmo. Alguns devolvem aos trabalhadores, outros utilizam como "fundo de ferro" para financiar as oposições, os movimentos sociais e a luta de outras categorias contra as burocracias. Entretanto, o mais importante é que é a base que deve decidir em assembleia o destino do dinheiro, já que o desconto é obrigatório e feito pelo governo.
Vivemos um momento da luta de classe muito importante em
nosso país. As jornadas de junho deixaram os governos e as burocracias sindicais
atônitas, várias categorias tem arrancados vitorias importantíssimas através da
mobilização de suas bases, os professores do Rio de Janeiro ano passado e os
garis no carnaval deste ano são exemplos do que estamos falando. Está mais do
que na hora de a categoria que mais se enfrentou com os governos nos últimos 20
anos, através de greves, ocupações de câmaras e passeatas, voltar a ocupar as ruas e botar pra correr as
burocracias que tantos têm prejudicado nossas vidas, aqui no Estado, essas
burocracias se traduzem nas direções pelegas do Sindeducação (UGT/PMSL/PCdoB) e
do Sinproesemma (PCdoB/CTB), que têm aplicado políticas contra os interesses
dos seus sindicalizados, já que o imposto sindical garante a sobrevivência do
sindicato e os privilégios das direções pelegas.
Por tudo isso, somos terminantemente contra o imposto sindical. A CSP Conlutas faz um chamado a todos os
trabalhadores e trabalhadoras a se engajarem na luta por seus direitos e
rechaço as direções traidoras. Acreditamos que a vitória de nossa categoria só
vira mediante a luta contra os governos e contra as burocracias, miremos-nos no
exemplo dos garis do Rio de Janeiro. Retomamos a epígrafe de Marx que abre esse
artigo, “A libertação da classe trabalhadora tem que ser feito dos próprios
trabalhadores”.
* Professor de Matemática da Educação Básica no Maranhão, Militante da Setorial de Educação da CSP Conlutas MA e do PSTU.
REFERÊNCIAS
ALMEIDA, José Maria de. Os sindicatos e a luta contra a burocratização.
São Paulo: Editora Sundermann, 2007. pag.74.
CANARY, Henrique. O que é sindicato in O que é... Conceitos
fundamentais de política, economia e sociedade. São Paulo: Editora Sundermann.2010.
GIANNOTTI, Vito. História das Lutas dos trabalhadores no
Brasil. Rio de Janeiro: Mauad X, 2007.
MARX, K.; ENGELS, F. Manifesto do Partido Comunista. 1.
ed. São Paulo: Expressão Popular, 2008.